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Latitude - Marcelo Moscheta
Liliana Rodrigues

Curadora Independente e Crítica de Arte



As paisagens de Marcelo Moscheta despertam emoções intensas e essenciais, que há muito estão adormecidas em nossa cultura e que, talvez, estejam hoje ameaçadas. Elas estão relacionadas à sensação de sublime dificuldade, ou mesmo impossibilidade, do atual mundo de valores fugazes e imagens digitais. “Latitude” fala da admiração do artista pelas expedições do passado a lugares remotos e inexplorados, hoje um mito, uma vez que o distante tornou-se simplesmente uma possibilidade através de nossa condição digital.

Como ato de resistência, o artista reivindica a laboriosa e paciente tarefa do trabalho manual quando produz seus desenhos. No entanto, pensar nestes como meramente românticos em conteúdo e acadêmicos em técnica exclui completamente seu ponto principal, assim como seu nível de complexidade. Estes desenhos representam paisagens que reconhecemos famosas por serem parte de nossa cultura – como em “Friedrich” – ou que foram inspiradas em imagens de paisagens que circulam na mídia. São, assumidamente, representação da representação, sem lugar na realidade. Fazem mais do que negar seu referente, negam também sua própria mídia.

Quando Marcelo Moscheta se debruça sobre o PVC expandido, ocorre um processo de fixação que, de maneira metafórica, remete à fotografia. Inicialmente, uma espessa camada de pó de grafite é colocada sobre o sensível suporte de plástico sem, contudo, a ele se fixar. A partir daí, o artista usa uma borracha para, cuidadosamente, apagar ou retirar essa camada e uma sombra escura aparece, exatamente como no quarto escuro. Apontando para o processo de produção de fotografia, os desenhos de Marcelo Moscheta, no final, parecem pinturas.

Uma negação final tem lugar quando Marcelo Moscheta atribui um sistema de coordenadas errôneo para suas quietas e silenciosas paisagens. Mais uma vez, sem encontrar correspondência com o mundo real – as coordenadas nos remetem erradamente para o Pólo Sul – os desenhos trazem um sentimento de objetividade, opondo ciência àquilo que, em primeiro lugar, acreditamos ser uma mera representação romântica.

O código de coordenadas da imagem, a imagem como código de cultura e o quadro como um lugar de convenções podem servir para provar que, em nossos dias apressados e virtuais, após um segundo, terceiro, quarto olhar, adiar nosso julgamento pode ser decisivo.


texto da exposição Latitude, apresentada na Galerie Anita Beckers em 2008.